domingo, fevereiro 04, 2007

Carta da Flor do Sol (Da série Sagrados e Consagrados)

vou partir
como se fosses tu que me abandonasses

o último sonho que tive era estranho
via o fundo límpido de uma rua estreita
que desembocava num largo iluminado
havia leões empalhados nos passeios em areia solta
já não me lembro bem
parece que uma mulher avançava com um envelope na mão
estendia-mo e gritava
mas eu não conseguia perceber
insultava-me muito provavelmente
tinha a cara escondida por um pano branco bordado
apenas via a sua enorme boca abrir-se
e furiosamente engolir a púrpura do ar
que envolvia as cabeças reclinadas dos leões
ouvia o buzinar nervoso dos carros
exactamente como se ouvem agora
mas não conseguia vê-los
depois
um rapaz pareceu a uma esquina e reconhecia-te
uma voz gravada na memória acompanhava-nos
quando nos dirigimos um para o outro
em câmara lenta
ouvíamo-la sussurrar: procuro-te
no interior das penumbras no esquecido sal
das casas abandonadas à beira-mar
procuro-te no perfume excessivo do mel
armazenado pelas abelhas no entardecer das pálpebras
vem
mergulha as mãos nos troncos das árvores
suspende a noite da longa viagem
estás a naufragar
o espelho quebrou-se e tu já não reconheces as paisagens
o corpo estilhaçou-se
(continua aqui)

imagem: maria isabel batista, o acordar das gaivotas

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2 Comentários:

Anonymous Anônimo disse...

Que saudades de vc... Quanto tempo sem vir aqui, só nesta vida louca de mãe! Mas vou tentar não desaparecer mais. Me faz tão bem te ler!
Beijos

21/2/07 22:16  
Blogger Gláucia disse...

Letícia,
também estava com saudades de vc. Acompanho sempre as aventuras dessa dupla meineira querida, através do blog.
Apareça quando puder. Mas a vida de mãe nova é uma loucura mesmo. Sei bem! Bjs pra ti e pra Isadora.

23/2/07 23:23  

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