quinta-feira, março 08, 2007

Rumor dos Fogos - 3 (Da série Sagrados e Consagrados)




hoje à noite avistei sobre a folha de papel

o dragão em celulóide da infância

escuro como o interior polposo das cerejas

antigo como a insónia dos meus trinta e cinco anos


dantes eu conseguia esconder-me nas paisagens

podia beber a humidade aérea do musgo

derramar sangue nos dedos magoados

foi há muito tempo

quando corria pelas ruas sem saber ler nem escrever

o mundo reduzia-se a um berlinde e

as mãos eram pequenas

desvendavam os nocturnos segredos dos pinhais


não quero mais perceber as palavras nem os corpos

deixou de me pertencer o choro longínquo das pedras

prossigo o caminho com estes ossos cor de malva

som a som o vegetal silêncio sílaba a sílaba o abandono

desta obra que fica por construir... o receio

de abrir os olhos e as rosas não estarem onde as sonhei

e o teu rosto ter desaparecido no fundo do mar


ficou-me esta mão com a sua sombra de terra

sobre o papel branco... como é louca esta mão

tentando aparar a tristeza antiga das lágrimas


(al berto)

imagem: dionísio leitão

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3 Comentários:

Anonymous Anônimo disse...

Lindo.

9/3/07 12:25  
Blogger Gláucia disse...

Adoro Al Berto. Acho tudo.

9/3/07 22:18  
Anonymous Anônimo disse...

Lindo fim de dia ida casa espera, levo o que me leva a qualquer lugar eterno sem ficar longevo.
Também levo a dádiva de ter Al berto e, sobretudo, compreendido o glaucignificado da Margarida Inventada. Há braços e beiços na alma... com a umidade do velho Uruguai.

13/3/07 19:35  

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